sábado, 19 de abril de 2008

O Cego Que Observa o Céu

Era Velho e Cego. Quando comentou de forma destemida que ia escalar aquela montanha, toda a gente o tentou impedir argumentando que era um feito impossível. Falaciosos conselhos que não o impediram de caminhar naquela direcção...
O suor que lhe percorria o rosto dava-lhe mais força para continuar. Nas raras vezes em que o cansaço vencia o seu corpo, ele sentava-se nalguma rocha e acariciava a sua forma. O seu rosto dirigia-se ao céu, não sabia a sua cor mas via-o como ninguém. A brisa que lhe era enviada rasgou-lhe o rosto de rugas durante toda a vida e ele sempre soube agradecer isso.
Enquanto caminhava sentia cada pedra que calcava. Isso acentuava-lhe a dor nos pés mas ao mesmo tempo fazia com que ele tomasse conta da fraqueza das pedras e da sua superioridade sobre elas.
Ouvia os sons da aldeia cada vez mais distantes. Era estranho ouvir a buzina do padeiro e não cheirar o pão matinal. Em vez disso sentia o perfume eterno e envolvente dos pinheiros.
Continuou a subir até sentir que tinha chegado ao cume. Ergueu-se sobre o horizonte de braços abertos e "viu" o mundo como nunca o tinha "visto" antes.
Numa voz rouca e cansada, mas jovem como jamais havia soado, gritou do cimo da montanha:
- Ganho uma vida em cada minuto
O som propagou-se e ecoou num colossal raio de espaços e esperanças. O surdo ouviu, o mudo murmurou o que acabara de ouvir e o coxo perseguiu a origem das palavras até encontrar o velho homem.

Texto: Carlos Rodrigues

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Fósforos...


Vivemos numa caixa de fósforos. Corremos desnorteados lá para fora e o que vemos?
Falsas pessoas com falsos sentimentos. Mostram sorrisos e no fundo preferiam nem ter nascido. Olham-nos de lado como se fossemos seres diferentes. O olhar apreensivo das pessoas assusta-nos já que não somos mais que meros peões manipulados pela sociedade. Sociedade? Marionetas humorísticas, irónicas, cansadas, impacientes, insignificantes, que percorrem direcções erradas sem saber que rumos tomar. O reflexo do espelho nem sempre nos dá aquilo que queremos.
Olhamos para outro lado e vemos a coisa mais simples da vida. Um simples abraço, um sorriso conjunto dá-nos aquilo que mais esperamos no fim de um dia, o reconforto de viver. Somos os pequeninos fósforos da caixa à espera de serem acesos. Pequeninos mas significantes na vida de alguém, porque afinal a caixa tem tantos outros pequenos fósforos e não seria uma caixinha sem estes.
Há fósforos bons e outros nem por isso. Apenas temos que saber lidar na caixinha apertada com aqueles que não prestam, porque no fim somos sempre necessários para uma finalidade.
Texto: Cláudia Silva
Foto: Cláudia Silva

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Porquê?! Porque Não! Mas Porque Não?! Não Sei...

“Qual a tua resposta a esta pergunta?”

Foi desta forma objectiva que a questão foi colocada aos leitores. O “Não” ganhou a sondagem obtendo 10 votos (40%). É o processo cognitivo normal, em caso de dúvida reponde-se negativamente.
“Torradeira” foi a resposta dada por 6 pessoas (26%). Acredito que essas pessoas ou gostam muito de torradas ou gostam de dar respostas ridículas a problemáticas sérias, de interesse universal.
Com 5 votos (20%), a resposta “Aristóteles” aparece no 3º lugar. Aqueles que responderam desta forma quiseram armar-se em intelectuais, filósofos ou apaixonados pela Grécia antiga. Ora pois bem, o voto é secreto e a democracia nasceu na Grécia...
“Azul”, a cor do mar, do céu, a cor da melancolia, a cor que está na origem do nome do género musical blues, é igualmente a cor do Futebol Clube do Porto e só assim se pode perceber o porquê de ser a opção menos votada pelos nossos leitores. Recolheu apenas 4 votos (16%). (Desculpem qualquer coisinha, Hehehehe) Mééééééé.
Texto: Carlos Rodrigues

sexta-feira, 4 de abril de 2008

“Os Homens preferem as Loiras”, As Mulheres preferem os Negros…

“Com quem gostarias de ver a Stoned Sheep Contracenar?”
Pela primeira vez na existência deste blog, tivemos uma igualdade entre duas das hipóteses relativamente a esta questão. Marilyn Monroe e Danzel Washington obtiveram 7 votos cada (25%). A academia Stoned Sheep resolveu atribuir o papel a Danzel Washington por duas razões: Em primeiro lugar porque a diva não se encontra em condições para desempenhar o papel, correm até boatos que já morreu, embora na minha modesta opinião ela seja eterna; em segundo lugar porque os argumentistas querem dar uma vertente romântica à obra e afirmam que não estão interessados numa relação lésbica. Portanto, Danzel Washington é o escolhido para contracenar com a Stoned Sheep. Finalmente vamos ver uma interacção entre a ovelha branca e uma das ovelhas negras de Hollywood.
Marlon Brando com 6 votos (21%) foi a terceira escolha dos nossos assíduos leitores. “I’m going to make him an offer he can’t refuse” não foi proposta suficiente para convencer os cibernautas, que podem começar a temer a vingança do maior dos Corleone.
Meg Ryan recolheu recolheu 5 votos (17%) e pode continuar a sonhar com papéis nos quais ela é o mais adorável do anjos.
O britânico Jude Law não foi além dos 3 votos (10%) o que revela que andar a mostrar a pila em público é uma estratégia de persuasão que já não resulta nos nossos tempos.
Quem se deve reformar com a máxima urgência é Meryl Strip. A actriz obteve um número vertiginoso de votos, ou seja, nenhum. O nosso conselho é a ela aproveite “as horas”, mas também cada minuto e cada segundo da sua vida para se dedicar aos seus netinhos, se é que os tem.
Faltam poucos Dias para o final da sondagem desta semana “Qual a tua resposta a esta pergunta?”, Apressem-se a votar ;)

Texto: Carlos Rodrigues

Finding Neverland


Nunca o vi vaguear de dia, como vagueou por todas aquelas noites...


Como acontecia todas as noites, saiu á socapa, pelas traseiras de sua casa. Os meus olhos seguiam-no da varanda com curiosidade. Nunca lhe havia conhecido o rosto, nunca lhe havia vislumbrado a cor do olhar. A sua boina sombreava-lhe todas as feições que nunca passaram de um enigma indesvendável para mim. Deslizou sobre o solo até pegar na sua velha bicicleta negra. Vi-o desaparecer na penumbra depois de ouvir o rangido do portão.
Desci as escadas com a respiração acelerada e abri a porta. Avistei-o no fim da rua, andando ao lado da bicicleta. Decidi segui-lo. Ouvia o som dos meus passos que tanto me esforçava para disfarçar e o meu coração que parecia querer saltar do peito. Andei durante minutos que me pareceram horas, até que ele parou em frente ao muro de um cemitério. Levantou-se um nevoeiro que me serviu de camuflagem gélida e petrificante.
O que se passou a seguir ficou-me na memória para sempre. Vi-o saltar o muro e aproximei-me do portão para espreitar. Foi então que ele tirou do bolso algumas sementes que atirou ao ar e imediatamente se espalharam por aquelas terras.
Num curto espaço de tempo os sepulcros desapareceram e deram lugar a um prado pintado por papoilas e malmequeres, a noite virou dia de céu azul e o tormento dos defuntos tornou-se a felicidade estonteante de borboletas e pássaros que giravam em torno da cabeça do velho homem.
Nessa Noite finalmente o reconheci, era Ninguém.

Texto:Carlos Rodrigues
Foto: Cláudia Silva

Chuva "Molha Parvos"!


Apetece-me hoje falar em meteorologia. Preocupa-me saber que há quem transforme dias de sol em dias de chuva, e mais do que isso, reparar que por vezes se usam chapéus-de-chuva para evitar o sol. A minha sugestão passa por desmistificar esta questão que tem mais de ideológico do que parece. Em dias de tempestade os chapéus-de-chuva são completamente inúteis, o vento os levará mais cedo ou mais tarde; em dias de chuva oferecem-nos uma falsa ajuda, temos a mania de dizer que nos protegem, que nos mantêm secos, quando a verdadeira protecção passa pela apropriação àquilo que é natural. Como queremos criar uma fortaleza sem acarretar com as pedras?
Pode ser maravilhoso o sentimento de liberdade, Amar ou simplesmente passar um dia “singing in the rain”, porque nem só os dias de sol são dias favoráveis. Se queremos valorizar a nossa vida, torna-se importante, quiçá urgente aproveitar cada um destes momentos, porque algumas gotas de água escorrendo num rosto molhado podem ser tão ou mais reconfortantes do que um raio de sol.
Um dia poderemos mesmo precisar de chapéus-de-chuva, então o melhor é guardá-los para essa ocasião e não os desgastar. Até lá o melhor que temos a fazer é deixar de lado a nossa tendência para dramatizar ou fazer “tempestades em copos de água”, como queiram. As verdadeiras tempestades são aquelas que para além de nos levarem o chapéu-de-chuva, nos levam um pouco da alma. E, numa dessas situações não nos queixaremos que ficámos só com as varetas na mão, ostentando um sorriso trocista.

Texto:Carlos Rodrigues
Foto:Carlos Rodrigues